Hospedaria de Palavras: romantico

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João despertou como todos os dias, às sete horas da manhã. Espreguiçou-se e foi beijar sua esposa, mas...

"Alice?", gritou, esperando a resposta dela, que não estava na cama; todavia, não obteve resposta. "Ah! Deve ter saído para fazer compras", pensou.

Ao sair do quarto, reparou que a louça ainda estava por lavar, o chão por varrer, os lenços que enxugaram as lágrimas de Alice na discussão da noite anterior ainda estavam ali naquele canto, jogadas.

O banheiro estava da maneira que ela havia deixado, com exceção de alguns lenços descartáveis a mais na lixeira. "Com certeza ela veio chorar aqui, depois que dormi", pensou.

A casa estava silenciosa e triste; lá fora, o céu estava nublado e chovia, diferente do dia anterior, que foi ensolarado e alegre até o anoitecer.

João foi até a cozinha, pegar um copo de leite e alguns biscoitos antes de sair para trabalhar, e encontrou o celular de Alice em cima do balcão. "Que estranho... Ela nunca sai sem celular", pensou. Comeu, escovou os dentes, pegou o celular e as chaves, e saiu.

[...]

Eram quatro horas da tarde quando João chegou em casa e, para sua surpresa, ela continuava da maneira que estava quando saiu. Preocupado com o que ocorrera e com a falta de notícias de sua amada, recorreu ao telefone.

Ligou para os pais e amigas, e obteve a mesma resposta: "não a vi hoje", "ela não está aqui". No trabalho, ela apenas tinha avisado que não compareceria.

O desespero tomou conta de João. Onde estaria Alice naquele momento? Por que ela sumiu? Será que ela foi embora? Ou sequestrada? Será que estava bem? Atordoado com esses pensamentos, arrumou a casa, esperando que a qualquer momento ela entraria por aquela porta de madeira, trazendo-lhe paz e alívio.

Entretanto, isso não aconteceu. As horas foram passando, nenhuma notícia surgiu; João já chorava, pronto para ligar para a polícia ou sair atrás dela por aí.

[...]

Quase meia-noite, e João não conseguia dormir. Relembrava toda a discussão que tiveram na última vez que a viu. Alice havia guardado os documentos dele e não se lembrava onde os havia deixado. João já estava enlouquecido em busca deles, e por não os ter encontrado, disse palavras duras à ela, que respondeu igual. Ele sabia que havia magoado a frágil mulher; porém, manteve-se arredio em sua forma de falar, até que viu que Alice já não conseguia segurar o pranto, e soluçava de uma maneira assustadora, como se lhe faltasse o ar. Ela correu para o quarto, pegou uma caixa de lenços, voltou para a sala e mandou que ele a deixasse sozinha. Foi quando ele saiu, e só voltou quando ela já estava dormindo, e foi fazer o mesmo.

João se sentia angustiado. Virava-se e rolava na cama, até que se levantou e acendeu a luz do quarto. Ao longe, em cima da cabeceira, haviam alguns documentos e algo que parecia um bilhete. "Como não reparei nisso mais cedo?", pensou. Caminhou até lá, pegou o bilhete e leu.

Quando terminou, João se ajoelhou e orou. Pediu a Deus que sua esposa voltasse, pois sentia muita saudade. Arrependeu-se profundamente do que havia feito, pediu perdão e uma oportunidade para fazê-lo à sua amada. E chorou até adormecer.

[...]

João acordou no susto com o despertador que anunciava já ser sete horas da manhã. Olhou para o lado e não viu Alice. Correu para a sala, e ela não estava lá.

Alice pegou suas chaves e abriu a porta. O rosto abatido, olhos inchados e vermelhos pela falta de sono e pelas lágrimas, os cabelos um pouco bagunçados. Ele correu para abraçá-la, e pedir perdão inúmeras vezes.

- Onde você estava, meu amor? - soltou, com ar de desespero.

- Andando por aí. Pela manhã fui ao ginecologista, e o resto do dia passei por aí, sem destino.

- Amor... Sem você eu perco o chão, fico sem rumo. Minha maior alegria é você. Esta casa não tem paz nem felicidade sem você. Não sabe como estou feliz em poder te segurar em meus braços...

- Daqui nove meses você terá outro alguém para segurar em teus braços...

Os dois se olharam. Os olhos de Alice brilharam e João, surpreso, ajoelhou-se e beijou o ventre dela. Um filho.

Alice acordou com o despertador, às 5:30h da manhã. Aquele sentimento de tristeza, melancolia, que havia invadido seu coração na noite anterior, após o desentendimento com João, ainda permanecia em seu coração.
As palavras que ele lançara, ficaram cravadas em seu peito, em sua memória: "Você não quer me dar atenção". Para qualquer um seria uma besteira se desentender daquela maneira por causa de uma frase boba dessa; mas Alice se magoou, ainda mais pelo fato de estar estudando, e que por ter ficado no telefone falando com ele, não o fez antes.
As lágrimas ameaçavam cair de seus olhos, mas ela não se permitia chorar. Em suas orações, ela pedia: "Oh Senhor, não quero me sentir assim... tira de meu coração toda essa tristeza...".
Fora para a escola, e quem diria, o dia estava nublado, com um vento frio, apesar de estar em pleno verão. Na escola, foi dia de prova. Uma prova difícil, complicada, que a deixou de cabelos em pé, coração na boca e com a mente travada. Não conseguia mais pensar; o pânico tomara conta dela, sua pressão arterial ameaçava subir, uma sensação de estar prestes a desmaiar queria tomar conta, e aquilo tudo estava tornando aquele dia o mais triste de sua vida.
Chegara em casa mais cedo; o que não a fez almoçar mais cedo. Logo, foi para seu curso. Estava se sentindo muito sozinha; mesmo recebendo mensagens de seu amado. Era preciso mais: ela esperava uma ligação... ela queria ouvir sua voz desde de manhã cedo, mas ele não a ligou. Ela pediu a Deus que se movesse em seu sobrenatural, e de nada adiantou. Ele não ligou.
Em sua casa, trancou-se no quarto, e não saiu mais de lá. Ficou como num estado vegetativo, esperando o dia acabar, para ao menos falar com ele, ouvir sua voz, ou dormir logo de uma vez.
Eram 22h, e Alice ainda não havia conseguido superar a melancolia. Então, ela prostrou-se, e começou a orar, até que pegou no sono. Deus atendeu as suas preces; aquele momento de sono, era o momento em que ela sentiria paz, e no dia seguinte, a alegria voltaria para seu coração. Deus não a desamparou em seus momentos de tribulação, mas concedeu-lhe uma maneira de descansar de sua realidade dura, naquele dia fatídico de verão.

Eram três horas da madrugada, e Alice ainda estava sentada em sua mesa de jantar, com várias contas para pagar ao seu redor, e um caderno cheio de cálculos de orçamento. Estava tão concentrada naquela tarefa, que nem percebera o tempo passar. Apesar de perceber que não estavam numa situação agradável, ela tinha fé de que Deus não os desampararia.
João decidira se levantar, não estava conseguindo dormir sem sua esposa ao seu lado na cama. De robe cinza, abriu a porta, encostando-se no batente e observando sua bela mulher.

— Ainda fazendo contas, amor?

— Sim, querido. Não estamos numa situação agradável, vamos ficar apertados esse mês. Mas não se preocupe, Deus proverá.

Os olhos de Alice brilhavam, e João teve certeza de que a fé que ela tinha já o havia afetado. Deu alguns passos em direção à mesa, e sentou-se ao seu lado.

— Como chegamos nesse ponto, Alice?

— Estive fazendo os cálculos, e percebi que devido aos gastos extras que tivemos, como o dinheiro que enviei pra minha avó, o presente da Isabela, as contas também vieram mais caras esse mês...

— Amor... você andou dando mais do que o que sempre dá para aquela instituição que cuida de crianças abandonadas. Eu vi no seu recibo.

— Eu sei... não resisti ao ver aqueles olhinhos pidões daquelas crianças... como não resisto aos seus.

— Que saco, hein mô! Isso foi golpe baixo. E você sabe as regras que estabelecemos para administrar nosso dinheiro, mocinha.

Alice não aguenta e ri.

— Sei sim, amor. Nas contas eu incluí tudo: a parte do nosso salário que é para ajudar nossos pais, as contas que nesse mês vieram mais caras, o dízimo, tudo. Olha aqui.

João conferiu as contas efetuadas com perfeição por sua esposa. Olhou-a com aquele olhar de ternura, enquanto ela continuava preocupada em revisar suas equações para conferir se havia se equivocado em alguma.

— Hey amor, eu te amo. Você é a mais linda contábil que eu já vi na minha vida. Não importa se vamos passar por um pouquinho de dificuldade. Agora vamos pra cama, preciso de você pra dormir tranquilo.

Alice abriu o sorriso. As palavras de seu esposo sempre a fizeram se derreter por dentro, e mesmo naqueles momentos difíceis, ela sabia que era feliz com ele. Deu a mão para João, que a puxava em direção ao quarto, com uma paradinha no interruptor. Disse bem baixinho "obrigada Senhor, pela Tua provisão, por Teu amor, e por ter me dado o marido perfeito de presente", entrou no quarto, fechou a porta.